Era o primeiro dia de primavera daquele ano.
Lá estava ela, com seus vestidos de chita. Sempre gastara suas economias comprando roupas de brechó, porque tinham lá suas histórias. Por isso, os bróches. Quando pensava nos donos, surgiam altos filmes imaginários. A última aquisição fora uma caixinha de música. Sempre teve medo da solitária bailarina dançando ao som de valsa. Mas ela adorava afirmar sua excentricidade. Também gostava da sensação do medo que torna a gente meio apático, quase-coisa. Num é que um dia, quando ela desligou a televisão e firmou seus olhos para cair no sono profundo, a caixinha despertou sozinha. Ela, apática, permaneceu imóvel e ouviu toda a lamúria da bailarina. E depois dormiu. De manhã, pensou ser um sonho. Achou que a bailarina poderia estar cansada de ser uma escrava da vontade dos outros. Riu de seus pensamentos.
E também decidiu não dançar conforme a música.